sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Direito ao Respeito pelo Acusado


Massoxi reside com a família no bairro da Mabor. Numa madrugada foi assaltado por dois indivíduos que arrombaram a porta da sua casa. Ameaçaram-no com arma branca e a seguir puseram-no deitado num dos quartos. Os bandidos levaram consigo vários artigos de uso doméstico como peças de vestuário, o fogão, a botija e o televisor. No dia seguinte, já recuperado do susto, Massoxi seguiu os vestígios deixados pelos bandidos ao longo da rua e reparou, com surpresa, que iam dar à porta de uma casa há duzentos metros da sua. Massoxi, sem mais esperar, dirigiu-se à referida casa, onde foi atendido por um jovem de nome Fula.

Logo, ali mesmo, Massoxi que na altura fazia-se acompanhar de familiares seus, agarraram o mesmo Fula, ante o protesto e a recusa deste, alegando que era inocente, levaram-no à força para a sua casa. Posto no local, trancaram-no num dos quartos, dizendo que só o libertariam caso os artigos roubados aparecessem ou fossem pagos.


SIGNIFICADO E VALOR



A Declaração Universal dos Direitos Humanos no seu Artigo 11º, nas alíneas 1 e 2, afirma que:

1- Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.

2- Ninguém será condenado por acções ou omissões que, no momento da sua prática, não constituam acto delituoso em face do Direito Interno ou Internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o acto foi cometido.

Em Angola, por sua vez, a Lei Constitucional em vigor é muito clara, no que diz respeito aos cidadãos eventualmente acusados de qualquer acto criminoso. O Artigo 36 nas suas alíneas 3, 4 e 5 afirma o seguinte:

3- Ninguém pode ser condenado por acto não qualificado como crime no acto da sua prática.

4- A lei penal só se aplica retroactivamente quando disso resultar benefício para o
arguido.

5- Os arguidos gozam de presunção de inocência até decisão judicial transitada em
julgados. Como vimos, este artigo nos mostra que toda a pessoa acusada de ter cometido um crime, mesmo que flagrante, é suposto inocente. Isto porque quem acusa, muitas vezes, pode partir de determinados indícios que por si só podem não ser provas suficientes de culpabilidade. Por isso, é injusto fazermos justiça por mãos próprias, muito menos usarmos a nossa própria casa de cárcere. Devemos, sim, esperar que seja uma autoridade competente a dar o veredicto.

É frequente nos nossos bairros e comunidades pessoas serem feridas, espancadas gravemente ou mesmo mortas por acusações que ultrapassam o volume do crime cometido.

Por exemplo: tirar a vida à uma pessoa por qualquer motivo que seja, é um crime que os artigos 20º e 22º da Lei Constitucional em vigor em Angola condena, ao passo que a Declaração Universal dos Direitos Humanos no seu artigo 3º vem igualmente condenar tais práticas.

VANTAGENS E DESVANTAGENS



Dentre as desvantagens mencionamos os seguintes:

- A falta de um julgamento justo e imparcial.
- O castigo aplicado ao acusado em geral é desproporcional ao crime cometido.
- O acusado, mesmo antes do julgamento, é já considerado culpado, sendo por isso muitas vezes torturado até a morte. E no caso daqueles cidadãos que não podendo contratar um advogado, mas que, precisam de assistência Judiciária?

Nesses casos, quando o cidadão não puder pagar um advogado sobretudo por não dispor de recursos, deve o interessado fazer um requerimento em folha de 25 linhas dirigido, no caso de Luanda, ao presidente do Conselho provincial da Ordem dos Advogados de Angola, juntando a fotocópia do Bilhete de Identidade, o atestado de pobreza que deve solicitar na Administração do bairro ou no Governo provincial e o duplicado do processo completo se existir. Toda essa documentação deverá dar entrada no Conselho provincial da Ordem dos Advogados de Angola (OAA), sito na avenida Ho Chi Minh, no 1º andar do edifício do Instituto de Estatística de Angola.

PALAVRA DE DEUS


“Um testemunho isolado não será suficiente contra uma pessoa, seja qual for o seu crime, e a falta de que for acusado; só depois do depoimento de duas ou três testemunhas é que o caso será tomado em conta. Se uma falsa testemunha se apresentar contra alguém para o acusar de crime, as duas pessoas interessadas no debate comparecerão diante do Senhor na presença dos sacerdotes e dos juízes em função nessa altura. Estes examinarão atentamente o caso; se a testemunha é uma testemunha falsa e proferiu uma mentira contra o seu irmão, tratá-la-eis como ela tinha pensado tratar o seu irmão. Assim extirparás o mal no meio de ti.”( Dt. 19,15-19)

Textos complementares: SI 82, 3-4; Act. 22, 25 e 30.


AONDE ENCONTRAR A SOLUÇÃO?


Já vimos que,
quer a Declaração Universal dos Direitos Humanos como a Lei Constitucional de Angola apelam ao respeito e à presunção de inocência do acusado de crime, antes da decisão final do tribunal.

No entanto, isso exige, sobretudo em sociedades com grandes dificuldades como é a nossa, a tomada de medidas muito concretas da parte dos Órgãos do Estado encarregues de fazer a justiçar no país, pois estes devem estar dotados dos meios humanos e materiais capazes de dar resposta às preocupações dos cidadãos, inspirando nestes a confiança na justiça.

De igual modo, estes mesmos Organismos, na sua actuação devem demonstrar imparcialidade e celeridade.

Igualmente é imperioso munir as Instituições de ensino vocacionadas à formação de quadros no ramo de Direito com as condições necessárias para uma adequada formação dos discentes. Por outro lado, tanto a vítima de crime, como aquele que é acusado, ambos devem primar pelo recurso aos Órgãos de Justiça, nomeadamente à Polícia e aos Tribunais. Só assim, testando o funcionamento destes Órgãos, estariam a contribuir para o normal desempenho do seu papel.